segunda-feira, 26 de outubro de 2015

O exemplo do astrofotógrafo Carlos Fairbairn

Carlos Fairbairn, ao lado se seus setups compactos e simples, mas que são equipamentos ideais para astrofotografia de céu profundo.
 Carlos Fairbairn é um astrofotógrafo jovem que se destacou muito no meio este ano. Ele conseguiu dois APODs e uma imagem do dia no Astrobin. São reconhecimentos internacionais que colocam a astrofotografia brasileira em evidência no mundo, contra todos os obstáculos que enfrentamos em nosso país. Tais conquistas ajudam a alavancar a popularidade da astrofotografia amadora no Brasil, inclusive com matérias na imprensa de grande alcance, como o Globo.com.

Mas eu decidi falar do Carlos por que não pude deixar de notar suas boas escolhas, principalmente de setup astrofotográfico, adquirindo um equipamento fantástico e de rara portabilidade. Ainda mais que, infelizmente muitas pessoas parecem ter dificuldade para entender quais são os melhores equipamentos para astrofotografia e decidem por caminhos mais tortuosos, que levam à frustração e até à saída do hobby, mesmo que eu constantemente repita em meu blog e redes sociais quais são os equipamentos corretos para astrofotografia.

Veja aqui os posts que indicam equipamentos para astrofortografia

Vamos analisar o setup do Carlos: ele tem não uma montagem equatorial convencional, feita para telescópios, mas um tracker, que é um tipo de minimontagem voltada para a astrofotografia com lentes ou mini telescópios. O modelo que ele usa é o Skytracker da Skywatcher, que causou uma certa sensação no mercado ano passado pela versatilidade e por possuir entrada para autoguiagem, algo raro entre os trackers. A pequena montagem é compacta como uma EQ2, mas tem a qualidade de uma montagem maior e muito mais cara.

Ao invés de usar telescópios, o Carlos tem fotografado com lentes. Em astrofotografia lentes são como telescópios em miniatura. A lente que ele mais usa é uma Canon 200mm F2.8 USM II. Não é uma lente das mais caras. Eu até acho bem barata para as imagem que ela fornece - custa cerca de 700 dólares - já que é considerada uma das melhores lentes para astrofotografia existente. Na verdade, com 200mm de distância focal e uma abertura F2.8, esta lente é um telescópio refrator de 72mm de abertura, mas com uma velocidade muito superior aos telescópios de mesma abertura encontrados no mercado. Como acontece com quase todas as lentes, ela não apresenta seus melhores resultados quando totalmente aberta, mas basta fechar um pouquinho o diafragma, em F4, que temos um telescópio do nível dos melhores apocromáticos, e ainda muito mais rápido que a maioria dos refratores, que tem razões focais entre F6 e F7.5.

Quanto a câmera, aqui o Carlos pegou pesado na hora de investir. Ele trabalha com uma Canon 5D Mark III, uma das melhores full frames da Canon. Se compararmos o preço em dólares da 5D com a lente de 200mm e o Skywatcher Adventure temos que a câmera representa quase setenta por cento do preço do setup. Ou seja o esforço financeiro foi quase todo concentrado na câmera. Chega a parecer exagero, mas o resultado se mostra em imagens coma o abaixo, que foi foto do dia no Astrobin. E olha que ele ainda nem modificou a câmera.


A maioria dos novos astrofotógrafos tende a achar que a câmera é só um acessório a ser acoplado ao telescópio. Na verdade é o contrário. A câmera é o equipamento fim aqui. Ela são os olhos do astrofotógrafo, tudo o mais é que são acessórios. O resultado é que muitas vezes temos astrofotógrafos com telescópios fantásticos sem conseguir bons resultados por anos devido a insistência de não investir devidamente numa câmera realmente boa. Principalmente quando o objetivo é céu profundo, que exige câmeras mais caras, com resfriamento e sensores grandes e sensíveis.

Mas preste atenção: não estou dizendo que investir em telescópio ou montagem ruim seja a solução. Pelo contrário, todo equipamento dará seu retorno de acordo com o investimento feito, mas posso dizer com certeza que nenhum equipamento de astrofotografia dá mais alegria pelo dinheiro gasto do que uma boa câmera.

Mas não é só por ter o equipamento certo que o Carlos tem se destacado. Ele também tem se revelado um perito em processamento. Para mim, o que mais me chama a atenção em suas fotos e ele conseguir revelar nebulosas realmente pálidas, como na imagem abaixo, onde ele mostra tudo o que existe para se ver na região do Cinturão e Espada de Órion.



Agora vai uma dica, muito do aprendizado de processamento do Carlos foi graças a uma seção no Astrobin que pouca gente conhece, onde astrofotógrafos disponibilizam seus frames de captura ou processamentos crus para que você, que ainda não adquiriu seu setup astrofotográfico possa ir treinando processamento desde já.


E o Carlos ainda deve melhorar mais ainda no futuro. Seu equipamento, por melhor que seja, ainda tem algumas limitações. Em breve ele deve instalar autoguiagem em sua Skytracker Adventure e conseguir frames mais longos que os atuais um minuto que tem conseguido com a lente de 200mm. Além disso, quem sabe um dia ele tome a coragem de modificar a sua Canon 5D. Uma decisão que não será nada fácil, pois modificar um DSLR sempre incorre no risco de algo dar errado. Enquanto isso, vamos torcendo por céus limpos e que ele nos traga novas imagens de tirar o fôlego como as que estão em sua galeria no Astrobin.




segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Conceitos básicos da captura em Astrofotografia: Tempo de exposição, ISO e razão focal.

Meio que complementando o post de Dicas básicas para quem quer começar na Astrofotografia, que recomendo a leitura, e devido a muitas perguntas que recebo sobre o tema, decidi fazer um texto sobre os conceitos básicos que todo astrofotógrafo deve entender antes de iniciar a captura de um astro.

Tempo de exposição: é o tempo que o sensor da câmera permanece ativado captando luz. Existem dois tempos de exposição em astrofotografia: O tempo de exposição por frame e o tempo de exposição total.

tempo de exposição por frame é o tempo que a câmera permanece ativada capturando fótons em cada frame durante a captura. Esse tempo depende das condições do céu, da câmera do astrofotógrafo, do tempo que a montagem consegue acompanhar com perfeição e também do objeto fotografado. Objetos mais brilhantes, como a Nebulosa da Lagoa, podem ser bem registrados até com frames de 15 segundos de exposição, já objetos mais pálidos, como a Nebulosa Cabeça do Cavalo, exigem frames de pelo menos uns dois minutos numa DSLR.

Tempo de exposição total é a soma do tempo de exposição de todos os frames. Se você tem um registro de 10 frames de 6 minutos, então tem um tempo de exposição total de uma hora. Como quantos mais frames integrados melhor é o resultado final, quanto maior o tempo de exposição, melhor. É importante dizer que frames de calibração, dark, flats e bias, não contam na soma do tempo de exposição total, somente os lights.

Em astrofotografia planetária o tempo de exposição por frame é muito curto, de cerca de um centésimo a um décimo de segundo. Neste tipo de astrofotografia não é importante dizer o tempo de exposição, mas o número de frames capturados.

ISO: É o nível de sensibilidade da câmera. quanto mais elevado estiver ajustado o ISO de sua câmera, mais luminoso ficará o frame, entretanto o ISO tem um efeito colateral danoso: quanto mais elevado, mais ruído a imagem produzirá. É por isso que câmeras CCD voltadas para céu profundo nem sequer tem esse ajuste, fotografando no nível de sensibilidade mínimo possível.

Em câmeras DSLRs o ISO costuma ter o seu mínimo em 50 ou 100 e um máximo que pode variar muito de acordo com o modelo, por isso se você pretende fotografar com ISOs altos é importante entender o comportamento de cada modelo antes de adquirir uma DSLR. A maioria das DSLRs de entrada, com sensor cropado, como as Canon T5i, possuem ISOs máximo entre 3200 e 6400. Geralmente os melhores resultados destas câmeras estão no ISO 400 a 1600. Já DSLRs full frames podem atingir ISOs de 25 mil ou mais e registrar com ISOs mais elevados com muito menos ruído. Geralmente o ISO 3200 de uma DSLR full frame consegue ser melhor do que o ISO 800 de uma DSLR cropada. Mas é claro, DSLRs full frame são bem mais caras.

Nas câmeras de captura planetária a sensibilidade costuma aparecer como "ganho". Até pouco tempo era recomendado que esse ajuste sempre estivesse no mínimo, mas os novos modelos, como as ZWO, QHY5 ou Expanse permitem que você eleve este ajuste, capturando mais frames no mesmo tempo e conseguindo excelentes resultados em sua captura final.

A grande vantagem do ISO é reduzir o tempo de exposição necessário em cada frame. Se você fizer um registro de 30 segundos em ISO 800, conseguirá um frame com a mesma iluminação de um frame de 60 segundos em ISO 400, o problema será que o frame em ISO 800 terá mais ruído. Por isso ISOs mais elevados são utilizados não para se reduzir o tempo total de exposição, mas o tempo de exposição por frame, pois, ao se fotografar em ISO 800, é recomendado que você integre o dobro de frames que integraria caso estivesse fotografando em ISO 400. 

Astrofotógrafos recorrem a ISOs mais elevados quando precisam fazer frames com tempos de exposição mais curtos. Isso ocorre geralmente devido a dificuldades no acompanhamento dos astros em seu equipamento. Por exemplo, você quer fazer frames de dois minutos de exposição, mas com esse tempo de exposição as estrelas estão deixando rastros, não estão redondas ou mesmo estão esticadas a ponto de parecerem pequenos traços. Muitas vezes a única forma de resolver isso é diminuir o tempo de exposição por frame até que as estrelas fiquem redondas. Para compensar a perda no tempo de exposição por frame, você aumenta o ISO e para compensar o ruído de um ISO mais elevado, você aumenta o número de frames.

Razão focal: É a relação entre a distância focal e a abertura de seu instrumento óptico. Por exemplo, um telescópio de 1000mm de distância focal e 200mm de abertura tem uma razão focal F5. Um telescópio com a mesma abertura, mas 2000mm de distância focal, tem uma razão focal F10. Quanto maior for a abertura em relação a distância focal, menor é a razão focal. Só que quanto menor for a razão focal de seu telescópio, mais rápido ele captura luz numa proporção geométrica. Um telescópio com razão focal F5 captura luz 4 vezes mais rápido do que um telescópio com razão focal F10.

Nas lentes, ao contrário dos telescópios, a razão focal costuma ser definida como Abertura. Por isso uma lente de 100mm F2 na verdade é um pequeno telescópio com 50mm de abertura. Se fosse uma lente F4, seria um pequeno telescópio com 25mm de abertura. As lentes tem a capacidade de ajustar a razão focal, reduzindo a absorção de luz através do diafragma. Isso parece ruim, mas geralmente quando se fecha um pouco essas lentes a qualidade da imagem tende a melhorar, diminuindo aberrações causadas por deficiências ópticas do instrumento. São raras as lentes que astrofotografam bem em sua maior abertura, geralmente são as mais caras.

Lentes Canon de 50mm e abertura/razão focal F1.8, F1.4 e F1.2. Repare como o tamanho da lente aumenta quando a razào focal diminui. (Foto: Astrosurf.com)


Obviamente instrumentos ópticos de menor razão focal são os preferidos para fotografia de céu profundo, mas eles também são maiores e mais caros, pois a construção de um instrumento de menor razão focal é mais complexa do que a de um com razão focal maior.